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Sabe aquela história de que, para fazer sucesso, é preciso sair do interior? Bom, Rafael Botta, ator e diretor, ouviu muito isso ao longo de sua trajetória, mas hoje sabe que a realidade não é bem essa. Depois de viver em São Paulo e experimentar os benefícios da capital, ele retornou a Bauru para gravar o 1º curta aqui na cidade – e olha o destino não foi mera coincidência.

Rafael quis voltar à cidade natal para poder mostrar o quanto o interior é rico de talentos e possibilidades. Em ‘Vertentes’, curta que encerrou as gravações recentemente, o profissional conta a história de jovens que vão para a casa da avó no interior e encontram um mundo novo.

O Social Bauru conversou com Rafael para saber mais sobre este trabalho realizado na cidade, detalhes das gravações e como todos nós podemos ajudar mais este projeto do profissional. Confira o bate-papo:

Quando e por que você saiu de Bauru?
Saí de Bauru no final de 2006, logo depois de me profissionalizar como ator. Decidi ir pra São Paulo porque queria fazer coisas novas, buscar experiências profissionais e também pessoais. Aquele era o momento ideal pra isso, eu tinha 20 anos e se ficasse em Bauru dificilmente conseguiria sobreviver de arte por aqui. Assim como a maioria dos meus amigos, eu teria que trabalhar na indústria ou no comércio e levar a minha carreira como hobby, então decidi que se tivesse que ser assim, que fosse em algum lugar onde eu pudesse gastar todo o meu tempo livre aprendendo algo novo.

E por que decidiu retornar para a cidade para gravar o curta?
Eu adoro Bauru, gosto de estar aqui. Minha família, meus amigos e minha história estão na cidade. Acho importante retornar às nossas origens e tentar contribuir de alguma forma. Desde que rodei o meu último curta em São Paulo, o “Nina!”, coloquei na minha cabeça que precisava filmar em Bauru. Não por acaso, o roteiro seguinte seria uma história que precisava ser rodada no interior.

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Como foi a escolha do local das filmagens?
Filmamos em Bauru, Botucatu e Iacanga. Em Bauru foi em Aymorés, onde passei bons momentos da minha infância andando de bicicleta, com o pé no chão e em contato com a natureza. Tudo fluiu pra essa locação. Fiz uma visita no local meses antes e encontrei a casa perfeita. Consegui contato com os moradores, Dona Catarina e Sr. Sebastião, que nos ajudaram muito até o fim, e eles abriram as portas da casa toda pra gente. E olha que filmamos lá no dia do aniversário do Sr. Sebastião! (risos). A festa era dele mas o maior presente foi nosso. Já em Botucatu tivemos dificuldades pra filmar onde queríamos. Era um ponto muito alto da estrada que liga a cidade à Pardinho e chegando lá estava todo tomado pela neblina, muito vento e previsão de chuva. A equipe de fotografia do filme procurou imediatamente alternativas na cidade mesmo e encontraram o melhor plano B que poderíamos ter. E por fim, filmamos em Iacanga, na piscina de uma chácara.

Quanto tempo de gravação?
Foram 3 dias. O ritmo foi bem puxado, poucas horas de sono, pouco tempo pra comer, mas todos estavam na mesma sintonia, querendo ver o trabalho finalizado, curtindo e vibrando com cada cena. O clima nos bastidores foi delicioso, o que ajudou pra que os 3 dias passassem voando.

Como foi a montagem do roteiro? De onde surgiu a ideia?
Eu estava num momento de inquietude, querendo produzir algo ainda neste ano, mas não sabia o que. Foi quando vi uma foto publicada em uma rede social pelo maquiador e também produtor João DiCarvalho que veio a inspiração. Era uma bela foto de paisagem. O resto aconteceu, não sei explicar como a história e os personagens surgiram exatamente, mas em dois dias estavam impressos na minha mão. A história se passa num tempo em que ter celular era coisa rara, e com isso os jovens eram “conectados” a outras coisas. Sinto uma overdose de tecnologia hoje em dia, ficamos de certa forma escravos dela e isso não é saudável. Eu queria falar de amor, mas do amor na fase das descobertas, do olho no olho, do frio na barriga. Os primos Ana e Pedro chegam ao interior para uma temporada de férias na casa dos avós. Alguns fatos os levam a conhecer Juliano, um jovem rapaz da vizinhança que logo se torna guia da dupla na cidade, mostrando sua rotina e como escapar do marasmo do local. A forte amizade entre os três se desenrola num clima de liberdade e descobertas, fazendo com que percebam novas possibilidades nessa relação. Posso dizer que, sutilmente, se trata de um jogo de interesses e sentimentos.

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E eu vi que a maior dificuldade está sendo conseguir patrocínio, certo? Por que você acha que ainda é tão difícil?
Essa é sempre a maior dificuldade para quem trabalha com cultura, principalmente aos que não tem aquele apelo da midiático, que não tem um nome tão conhecido ou para aqueles que não são cantores que recebem milhões do governo para fazerem suas turnês por meio de leis de incentivo. O jogo político deixa tudo mais difícil, e o acesso à cultura fica cada vez mais complicado. É triste, pois no Brasil temos excelentes artistas em todas as áreas. A cultura está sendo deixada de lado e as pessoas se esquecem que a arte pode transformar vidas e melhorar a sociedade. Eu cheguei a publicar no meu Facebook uma semana antes de rodar o “Vertentes” que eu me sinto pedindo esmola toda vez que peço apoio a um projeto cultural, que todo mundo torce o nariz, vira a cara e te deixa falando sozinho. Muitas vezes você pede apoio e nem resposta te dão, nem que sim e nem que não, e acho isso uma falta de respeito enorme. Antes de rodar, nossa maior preocupação era bancar o transporte de todo mundo e principalmente a alimentação, e se você pede pão e suco em um supermercado eles te respondem que não têm dinheiro. Ou seja, mal te ouvem. Mas não deixo de fazer meus projetos por isso, e não é por falta de apoio que farei de qualquer jeito, mas é claro que as coisas poderiam ser bem mais leves se tivesse um envolvimento de empresários com o tipo de trabalho que fazemos. Mas vale ressaltar que tivemos sim alguns apoios que fizeram toda a diferença.

As pessoas ainda podem ajudar de alguma forma?
Podem sim, afinal encerramos somente a primeira etapa do trabalho. Até que ele ganhe forma e seja concluído, ainda vamos trabalhar bastante. Quem tiver interesse em divulgar sua marca nos créditos e material de divulgação do filme pode mandar um e-mail para [email protected] e solicitar o projeto. Existem cotas de patrocínio disponíveis e também outras formas de ajudar.

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Essa é a primeira vez que você tem um projeto assim? Gostaria que falasse um pouco sobre a sua trajetória.
Não. “Vertentes” é o meu terceiro trabalho em curta metragem. O primeiro foi “Cinza Vazio”, produzido em 2013 e lançado em 2014 (disponível no YouTube). Nele eu aprendi muito, havia acabado de me formar em Rádio e TV e juntei um pessoal da faculdade, abrimos para financiamento coletivo pela Internet e fizemos. Foi uma escola. Logo em seguida veio “Nina!”, também lançado no ano passado e que logo repercutiu. Depois de ser exibido em Bauru (a pré estreia foi aqui na cidade junto com o “Cinza Vazio”) “Nina!” foi exibido em São Paulo e logo recebeu um convite para uma mostra de cinema independente, também na capital. Depois disso foi exibido em Portugal, numa noite especial de cinema brasileiro. Em julho deste ano decidimos publicar meus dois primeiros curtas na Internet, e ficamos surpresos com a repercussão de “Nina!”, que hoje (três meses no ar) está chegando em 13 mil visualizações. Mesmo na Internet, os dois curtas serão exibidos em uma sessão especial em Maceió na próxima semana (dia 30) e participaremos com o “Nina!” do Encontro de Cinema de Camburi, litoral norte de São Paulo, entre os dias 6 e 8 de novembro. Logo em seguida seguimos para o Rio de Janeiro, onde vamos rodar o curta “Abismo”, também produzido pela minha produtora Cx2Filmes, co-dirigido por mim e roteirizado pela minha sócia, e também atriz, Renata Sarmento.
Mas antes dos curtas eu experimentei outras coisas. Estagiei por dois anos na etapa São Paulo do programa “Ídolos” pela Rede Record e estive na equipe de produção do longa metragem “A Primeira Missa”, da diretora Ana Carolina Teixeira Soares, que contava com a participação de Fernanda Montenegro, Rita Lee e grande elenco. Em publicidade trabalhei como assistente de arte.

São quantas pessoas na equipe? E a maioria são estudantes da Unesp, certo? Como surgiu a parceria e como foi a experiência?
São 18 pessoas, sendo 6 delas o elenco. “Vertentes” é uma co produção da Cx2Filmes com a Magan Estúdios, então a equipe técnica foi formada pelo Bruno Ducatti, diretor de fotografia do filme e proprietário da Magan. A equipe de produção foi convidada pelo meu assistente de direção, Luiz Moraes, que é aluno do 4º ano de Rádio e TV da Unesp e foi me apresentando o trabalho de um por um, até que formássemos a equipe final. Já no elenco aconteceu de tudo um pouco. Escrevi o roteiro pensando nos dois atores mais velhos, que viveriam os avós dos protagonistas. Para os papéis eu queria a atriz Guta Magnani, de São Paulo, e o ator João Guedes, com quem trabalhei junto em 1998 quando iniciei minha carreira no teatro aqui na cidade. Consegui os dois! Guta veio de São Paulo especialmente para filmar com a gente e o João Guedes aceitou o convite prontamente. Uma grata surpresa neste processo foi a minha parceria com o ator (e também diretor) Marco Giafferi, um dos meus ídolos da adolescência. Eu morria de medo dele (risos), mas por insistência de uma amiga em comum, tive o prazer de conhecê-lo e me surpreendi com uma pessoa extremamente doce e um ator disponível e entregue ao trabalho. Ele abriu as portas da sua casa para que usássemos para reuniões, ensaios e até uma cena foi filmada lá. Já o trio de protagonistas foi surgindo com o tempo. A primeira a entrar no projeto foi Bruna Ferreira, modelo aqui em Bauru e que queria fazer um trabalho como atriz. Foi ótimo, trabalhamos a personagem em alguns ensaios e fiquei surpreso com o desempenho dela no vídeo. Depois chegou o Raphael Alkamin, estudante do último ano de Artes Cênicas da USC e por fim, num teste, surgiu José Rondina (o Zé!), que fotografa muito bem e já veio pronto para o filme.

Você já comentou que gostaria que as pessoas percebessem que não é necessário estar em uma capital para fazer uma bom trabalho. Você acha que as pessoas ainda têm esse pensamento?
Sim, muita gente ainda pensa assim. Em São Paulo e no Rio, principalmente, eu vejo muita gente torcendo o nariz para produções que fujam das “patotinhas” deles, mas acho que precisamos oxigenar os festivais, as mostras e os encontros de cinema. É preciso abrir espaço pra todo mundo. Eu, particularmente, acho que muita coisa boa hoje em dia está sendo feita lá no Nordeste, e não falo só em cinema, falo da música, do teatro, de tudo. Não pretendo parar o meu trabalho no interior com o “Vertentes”, quero que ele seja só o primeiro de muitos. Aqui em Bauru temos o curso de Rádio e TV na Unesp que forma uma galera muito boa, mas a maioria deles vai embora da cidade quando o curso acaba. Ou eles voltam para a cidade de origem, ou caem no eixo Rio-SP, onde já tem todo mundo fazendo “mais do mesmo”, mas é onde encontram trabalho pra sobreviver. Mas tenho percebido um crescimento no mercado audiovisual por aqui, e fico feliz com isso.

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Como foi retornar a Bauru depois de tanto tempo? Quais mudanças pode reparar na cidade?
Foi um tanto surpreendente. Eu não esperava encontrar pessoas tão dispostas a me ajudar neste projeto. Eu realmente passei a acreditar que tudo daria certo depois de encontrar o Bruno Ducatti, da Magan. Ele me deixou seguro de que faríamos o melhor que pudéssemos e que, no mínimo, aprenderíamos juntos. Foi uma troca muito boa, com todos. Rolou uma energia tão bacana que deixou saudade em todo mundo já no dia seguinte após o término das filmagens. Bom, sobre Bauru pude notar que está crescendo cada vez mais, que está cada vez mais quente e que os buracos nas ruas já são problemas crônicos que tenho a sensação de que nunca serão resolvidos. Mas torço sempre pra que Bauru seja uma cidade linda e segura, os bauruenses precisam e merecem isso.

Pensa em novos planos aqui?
Sim, já para 2016.

E quando o público poderá conferir o curta Vertentes?
O filme já está em processo de montagem. Existem algumas etapas a serem concluídas agora, mas o empenho é pra que fique pronto ainda neste ano. Faço questão de que a primeira exibição seja em Bauru, no início do ano que vem, e depois disso participaremos das seleções de festivais de cinema.

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